Anotações de Sarita Albagli (plataforma CienciaAberta Ubatuba) sobre o Programa Rádio TEC de 18/03/2016:
Pedro Oliva – gestor da APAMLN.
UC criada em 2008, da categoria de uso sustentável, mar como território coletivo, pensar o futuro do patrimônio marinho, funcionamento por meio de um conselho gestor, com organizações federais, estaduais e municipais e da sociedade, buscando convergências e compatibilização de divergências. Está em curso o plano de manejo, com olhar especial para os pescadores artesanais, desde 2013.
Patrícia de Menezes – Instituto Polis.
Projeto Observatório Litoral Sustentável, dedicado a democratizar informações e promover diálogo e participação, para discutir, nos municípios do Litoral Norte, rumos futuros dessas cidades. O Observatório coordenado pelo IP trabalha com diversas instâncias da região, de participação regional, como o APAMLN, comitê de bacias (questão da água na região), fóruns e movimentos sociais (com destaque para fórum de comunidades tradicionais, caiçaras, indígenas e quilombolas) e gestores públicos. Organizam Mesa de Diálogos sobre grandes empreendimentos em implantação na região, e sobre turismo sustentável. Nessa região há uma rica biodiversidade, mais de 70% do território desses 4 municípios são de áreas protegidas (de floresta e mosaico de conservação do mar e seus recursos). Ubatuba (cerca de 100 mil habitantes) é particular em sua sociodiversidade (terras indígenas, quilombos e territórios caiçaras), que tem garantido formas alternativas de se relacionar com o território. Riqueza num contexto em que os maiores empreendimentos do país, como petróleo e gás, há uma disputa pelo mar. Etapa 1 e 2 do Pre-Sal, de exploração de petróleo e gás, além de obras viárias de grande porte, área portuária em São Sebastião que se propõe expandir para ser um corredor de exportação de grãos. Cidades divididas, desiguais: de um lado da BR Rio Santos, orla, infra-estrutura para quem não mora aqui, para veranistas, com ociosidade elevada, uso sazonal; do outro lado, moradores e trabalhadores de Ubatuba no sertão em condições inadequadas de moradia. Existem instrumentos de gestão territorial, como plano diretor do município e o ZEE (pelo Estado de São Paulo) que são determinantes do futuro da região.
Pedro - Contextualizar como surgiu o ZEE, lei federal 7661 de 1988, que estabeleceu o plano nacional de gerenciamento costeiro do Brasil. Maior parte da população do Brasil vive na zona costeira, necessidade de ordenação para garantir a qualidade de vida. Transmitiu aos Estados a possibilidade de fazer seus planos de gerenciamento costeiro e estabelecerem seus zoneamentos. Lei 10019 de 1998, plano estadual de zoneamento costeiro, fixação das comunidades tradicionais em seus territórios. Histórico de degradação da Mata Atlântica e de seus recursos marinhos. Em 2004 dec estadual 49215 ZEE do litoral norte, primeiro do Brasil, papel importante para manutenção das características locais, definida como região com vocação de conservação. Previsão de revisão do ZEE, avaliação dos resultados. Discussões desde 2010-2011 no âmbito do Grupo Setorial GERCO, que se reúne a cada 15 dias ou 1 mês, com participação de diversos setores dos 4 municípios (Ilha Bela, Caraguatatuba, São Sebastião, Ubatuba). Considerar empreendimentos chegando à região e aumento da população, como conciliar esse desenvolvimento com a qualidade de vida local. ZEE estabeleceu regras para uso dos ambientes terrestre e marinho, estabelece zonas para pesca artesanal, pesca amadora, marinas. Proibição da pesca industrial até 23 metros de profundidade, garantindo espaço para pesca artesanal. Só aqui temos o zoneamento marinho. Participação da população.
Felipe - Como ter informações sobre esse processo?
Pedro - Diversas informações sobre esses processos estão disponíveis no site da secretaria do meio ambiente do estado de são Paulo, com links para coordenaria de planejamento ambiental, com a legislação, mapas, atas de reuniões. E também é importante buscar os órgãos estaduais, secretarias municipais e sociedade civil representada. Participar das reuniões do grupo setorial do zoneamento costeiro.
Henrique – como enfrentar o desafio de pensar que cidade e que desenvolvimento queremos, considerando os grandes empreendimentos, a atividade turística, a economia local (pesqueira, agroecologia, produção familiar)? Dualidade – duas cidades interconectadas, que representam forças econômicas muito distintas. Pre-Sal é importante para economia nacional, mas com impactos e inserção no local próprios. Como utilizar esses instrumentos para equacionar a gestão do comum. Disponibilidade hídrica na região vem caindo nos últimos 10 anos. Como esses espaços de gestão e instrumentos jurídicos são espaços para desenhar o que queremos?
Patrícia – Resgate histórico do ZEE é importante. Forma de planejamento regional, na busca de conciliar, articular biomas ricos e crescimento econômico. Pode acirrar as desigualdades, essa dicotomia entre cidade informal e formal, entre orla e sertão. Se o planejamento não tiver representação dos interesses da população local pode ser forma de viabilizar novos empreendimentos de atores externos com outros interesses, ou se houver disputa sobre esse planejamento garantir direitos das comunidades que estão e cuidam desse território. Ubatuba quer crescer com novas áreas de expansão urbana para novas condomínios de alto padrão? As áreas de risco são as mais densas da cidade. ZEE vai definir vários tipos de zoneamento, incluindo Z4 áreas de expansão urbana. Há poucas áreas para expansão urbana (70% é área de preservação). Como e para onde crescer? Área entre o núcleo urbano e o parque (área de amortecimento). Se predominarem interesses imobiliários (vide Ubatumirim, onde há aprovado projeto de um novo condomínio, não para os caiçaras que têm muitas comunidades lá, mas para entrar no mercado), não ajuda a um desenvolvimento mais sustentável e includente. Áreas de expansão urbana para população de baixa renda, para habitação de interesse social, popular? Comunidades que vivem em áreas de risco têm prioridade para reassentamento. As áreas deveriam então ser priorizadas para essas populações. Na área de amortecimento do PESM, que é área urbana de Ubatuba, há bairros densos que têm direito de regularização fundiária (titulação da terra e acesso a infra-estrutura), plano diretor define como área de interesse social, plano diretor do PESM vertentes mais conservacionistas que não contemplam essa expansão. É preciso compatibilizar Plano diretor municipal, plano gestor do Parque Estadual da Serra do Mar e ZEE. Mais importante é que, nessa discussão, é preciso ter terra urbana para viver com qualidade de vida para um desenvolvimento includente de caiçaras que foram expulsos pela rodovia, e aumento do preço da terra nesses locais. No ZEE é importante definir áreas com padrões específicos para habitação de interesse social. É também regularizar e consolidar outros usos, como agricultura familiar, impedindo construção de prédios muito altos, sem aumentar muito a taxa de ocupação, para garantir outros usos que não só os empreendimentos imobiliários. Município deve aplicar o plano diretor. Por exemplo aumentar IPTU de imóveis ociosos. Zona especial de interesse social.
Pedro – Questão do crescimento é desenvolvimento? Reassentamento de famílias em áreas de risco. Ao mesmo tempo, queremos um turismo de segunda residência?
Felipe – Existe visão de referência sobre impacto dessas zonas de desenvolvimento, com empreendimentos como o Pre-Sal? Nossos instrumentos são suficientes?
Pedro – Pre-Sal um dos impactos é o aumento da população que vem com expectativa de emprego com a indústria de petróleo e gás. Qual nosso limite? Impactos no espaço marinho: risco de vazamento de óleo, como ocorreu em 2013. Apesar de pequeno influenciou na pesca e na maricultura (mexilhões), e impactos sociais decorrentes. Aumento do tráfego de grandes embarcações influencia pesca e rotas das migrações no ambiente marinho. Diversas reuniões são feitas para avaliar esses impactos, medidas de mitigação e contenção de impactos, e também condicionantes ambientais. Diversos instrumentos no licenciamento ambiental.
Henrique – Como isto se dá em outros países? Como podemos viver juntos? Com diversas formas de uso, reconhecendo esse dinamismo. Trabalhar a potência de ter um parque no território. Isso nos faz ter que pensar em soluções inovadoras. Populações tradicionais coincidem com áreas de florestas e áreas protegidas.
Patrícia – Dentre os desafios da rica natureza e sociodiversidade, junto com os grandes empreendimentos, há a oportunidade de reconhecer uma tecnologia social, um saber que essas comunidades tradicionais têm de se relacionar com o ambiente, de forma de vida, de encontrar soluções para a cidade que queremos. Nessa área de amortecimento ou na área marinha, é possível potencializar usos, práticas, nesses territórios para que o PESM seja visto como um parque da população dele, que ajuda a conservar e fazer uso dele. Educação e pesquisa, turismo de base comunitária que reforce o uso público desse parque. Por outro lado, proposta do governo do estado de privatizar esse uso. Há possibilidade de outro padrão rural-urbano? É necessária infra-estrutura para tal. Nos grandes empreendimentos, há uma tecnologia super avançada e novas profissões para extrair petróleo em águas profundas. É possível potencializar o conhecimento tradicional nesse cenário? Em Ubatuba, ciclo de expansão viária e portuária impactou muito mais Caraguatatuba e São Sebastião, onde aumentou muito a violência urbana. Ainda temos os impactos desses empreendimentos. Já sabemos que os principais afetados são os pescadores e caiçaras. Além disso, temos muito a aprender sobre os impactos desses empreendimentos, ainda desconhecidos. Ainda estamos nos apropriando e tentando entender. Há uma especulação que se reflete no valor da terra e dos empreendimentos imobiliários, influi diretamente na vida do cidadão e trabalhador de Ubatuba. Como podem influir nesse processo? A maioria não sabe que há uma revisão do ZEE. Quais as instâncias de participação e instrumentos de controle social. Existem representações da sociedade civil nesses mecanismos. Transparência da informação. Coloca à disposição o Observatório e o site, com muitas informações, mapas e formas de participar. Mapas interativos inclusive sobre mangue e restinga.
Pedro – Pergunta do Henrique não tem uma resposta fácil. Como aproveitar a oportunidade que temos? Resposta coletiva, pensar de forma coletiva, acesso a informação e em linguagem adequada para todos. No Estado de SP, mais da metade da água doce potável é produzida dentro das UCs, que nos ajudam a continuar tendo água. Comunidades tradicionais têm uma sabedoria sobre os usos da floresta, fármacos, frutos, e outras maneiras de usar a floresta, curas para doenças.
Felipe – Pergunta do Neto da Appru. Como vai começar o levantamento de áreas de manguezais no LN e como isso pode ajudar a preservação dessas áreas?
Pedro – Manguezais são berçários do mar. Foi diagnosticado no diagnóstico participativo da APAMLN. Há diversos estudos sobre mapeamento e delimitação das áreas de manguezais. Usar essa informação é precioso para definir formas de usos e conservação dos manguezais. Site da fundação florestal tem link para APAMLN.
Henrique – Há muita informação, mas não disponível de forma a instrumentar a intervenção social e pública. Existe muita pesquisa em e sobre Ubatuba, como esse conhecimento pode contribuir para tomada de decisão?
Final de abril será realizado seminário para discutir áreas de expansão urbana no LN considerando a revisão do ZEE.